Somos culpados por nossos atos ou vítimas infelizes de experiências
vivenciadas? Carregamos o estigma das marcas da cruz que tivemos que um dia
carregar ou somos capazes de ultrapassar barreiras e assumir atitude inversa
àquela que nos foi impingida? Diante de crimes hediondos, infelizmente tão
banalmente comuns, procura-se sempre encontrar uma razão, um porquê para o indesculpável
ato. Muitos alegam: maus tratos na infância, opressão socioeconômica,
desilusões amorosas, orgulho ofendido. É difícil fazer um julgamento imparcial
de um criminoso que alega ter matado por amor, por isso precisamos de um júri
popular para decidir, como representantes da sociedade, sua pena. Mas quem
julgará o indivíduo que marcado por seu passado comete um “crime” contra si
próprio? Em “Diário da queda” três membros de uma mesma família judia, avô,
pai e filho sofrem traumas que marcaram indelevelmente suas vidas. O avô veio
para o Brasil após sobreviver a Auschwitz. Passou os seus últimos anos
escrevendo uma enciclopédia onde diz como deve ser o mundo, mas guarda para si
a dor que o atormenta. O resultado podia ser outro? Seu filho, mesmo depois de
assistir a derrocada do pai, assume com sucesso o negócio da família, torna-se
um pai atento e um marido amoroso. O neto, no caso o narrador, autor confesso e
comparsa de uma infeliz brincadeira que quase aleija um pobre colega gói (não
judeu), tem sua consciência atormentada pelo ato e tenta esconder sua culpa no
álcool e nos casamentos fracassados que acumula na vida adulta. A questão
judaica é a base da pirâmide, o trauma coletivo universal que se imbrica na
alma e ganha altura nas atitudes individuais de cada um de seu povo. Já que não
se pode simplesmente enterrar no esquecimento as feridas sofridas, tem-se que
decidir entre se esconder por detrás das cicatrizes ou, a partir delas e por
causa delas, construir uma outra e nova vida.
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