sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Inadmissível

Acordou às cinco em ponto com os pingos na janela de março. Para você ver como as coisas andam estranhas na época em que se passa essa estória, virou a torneira e um sopro vazio sem água fez puf e se apagou. Ainda bem que se prevenira e deixara um baldo de plantão debaixo da pia, com o que ele fez uma ligeira ablução. Abriu uma latinha de refrigerante de cola para acompanhar o pão com salsicha e maionese. Vestiu seu terno bem cortado - hoje é dia de reunião da diretoria - e desceu. Ligou o carro por uns dois minutos até deixar o motor quente e macio e desligou. Abriu o portão e deixou-se levar pela corrente de gente que fluía tortuosa por entre os teimosos veículos que ousavam enfrentar o rush eternizado pelo sonho do carro próprio, muitos deles abandonados pelos donos em plena via. Pegou a fila do elevador as sete e trinta e nem bem dava oito quando pontualmente adentrou sua sala. Passou o antivírus no computador e abriu o relatório que havia preparado para a reunião. Um aviso de notificação no Face o atrasou um pouco; teve que compartilhar a piada com todos seus amigos. Mesmo assim foi o primeiro a chegar à reunião. Depois de muita discussão marcou-se outra para próxima semana, para se acertar detalhes. Voltou à mesa e pediu seu almoço pelo telefone. O sanduiche de presunto e queijo mais o suco de caixinha chegou meia hora depois. A tarde passou sem percalços, fora o ar-condicionado que pifou e a manutenção prometeu vir semana que vem.  Tentou ligar para a moça que andava ficando, combinar um jantar a dois, mas o celular dela esteve sem sinal a tarde toda. Sem coragem para arriscar voltou para casa nos mesmos passos da vinda. Depois de ser roubado em uma ou duas esquinas, chegou a casa em tempo de assistir a novela das sete, enquanto comia a pizza pronta esquentada no micro-ondas. Bebeu quatro cervejas vendo o jogo final da série C do futebol brasileiro e dormiu feliz, sonhando com o inadmissível. 

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