quinta-feira, 30 de junho de 2022

Mergulho

A morte me aguarda 
Escondida num 
Mar imenso de vida 

Pouco importa a
Profundidade
Do mergulho
E sim a delícia
Do corpo imerso
Na água que nos
Possui e nos chama. 

sábado, 25 de junho de 2022

Polis

Não sei se já hora de falar de política, da maneira direta que se costuma falar, pois para mim, falar sobre a vida em comum, é se entranhar na política. Mas deixo a divagação sofismática para me embrenhar na realidade nossa de cada dia, sem medo ou arremedo de dor. É óbvia a necessidade de nos livrarmos da excrecência que nos aflige os três últimos anos e poucos meses. Se errar é humano, persistir no engano é mero exercício de suicídio social. Mais que uma vitória do Lula no primeiro turno, sonho com um segundo turno sem a figura espúria do ignóbil capitão expulso das forças armadas. Sinal de amadurecimento social do nosso povo. A experiência dos quase sessenta anos nos couros que me assola, me faz entender que de vinte a trinta entre cem habitantes deste lindo e triste pais consideram a vida social como mero parque onde eles podem brincar sem nenhum pudor. Maneira alguma pretendo demovê-los de seu pensamento. Insulto-os, mesmo sem esperança, a tão somente uma reflexão democrática. Ninguém tem mais o direito de ter medo de ser feliz. 
 

Gil Bosco

Grão em Drão
A gente colhe 
Sonho por sonho.
E nem escolhe
O que plantar
No terreno fértil
Do afeto e 
Da ternura. 

Chora sem dor
A Maria que se 
Queria Clarisse,
A esperança que
Podia ser sobrinha
Do louco equilibrista
Que sonhava germinar
Mesmo em vil ditadura. 

Quem sou eu?

Libertar-se de si mesmo é condição indispensável para se imiscuir no mundo e entender o espantoso conceito de humanidade. Acumulamos todo um arcabouço de ideias e verdades que nos aprisiona e imbute preconceitos que nos ofusca a compreensão da realidade como uma só. A expansão das possibilidades de trocas de experiências humanas nos permite tanto a aceitação do diferente quanto a sua quase completa rejeição. Tenho sérias dúvidas quanto ao futuro do humano como espécie; na verdade me volto mais para o lado pessimista dessa história. Mesmo assim não me permito deixar de sonhar com uma unidade orgânica e funcional de nos entender, coisa que só será possível quando relativarmos a significação do Eu. 

sábado, 18 de junho de 2022

Lágrima

Encontrei a solidão
No canto de um quarto
Escuro e vazio. 

Chorava baixinho
Quase sem 
Machucar o ar.

Cheguei de mansinho
E perguntei por onde 
Andava o seu par.

Enxugou a única 
Lágrima e disse
Que ele sonhava 
Outro sonho,
Em outro tempo,
E nenhum lugar. 

sexta-feira, 17 de junho de 2022

Jardim Menino

Uma criança 
Sorriu no meu jardim. 
Não foi uma flor, 
Um gato ou
Ou um passarim.
Foi um menino
Encarnado,
De rosto sorriso
Passado, 
De braço bem mais 
Que agarrado com a
Vida que lhe devia.
Mas mesmo assim 
Ele sorria,
Pois mais do que tudo
Sabia que nenhum 
Mal lhe podia
Tirar do rosto 
A alegria que 
Tão bem e só
Lhe cabia. 

terça-feira, 14 de junho de 2022

Meu Tempo

Meu tempo 
É hoje
Até o dia 
Que a Morte
Me levar, 
Quando serei 
Ontem na 
Saudade que 
Luto a todo 
Instante 
Para deixar. 

domingo, 12 de junho de 2022

Valantine

Viver enamorado com a Amada e com o Mundo é mais que uma questão de bem estar, nada que se agradeça a pura  sorte, mas algo cultivado em prol de cada grão. Não é mera escolha, muito menos resignação. É mais como por-se a boiar no mar do improvável, se deixar levar pela maré da pouca dor. Porque amar sem senões é se perder no mundo dos sonhos, desconhecer a realidade dos diversos cheiros que os infindos recantos da pele exala. Amar é a mais pura realização de qualquer inocente desejo, é saber que somos um só na unidade que nos cala. 

sábado, 11 de junho de 2022

Chulé

...

Escuta,

Vou te contar 

Um segredo:

Bem melhor 

Viver com medo

Que não temer 

Ficar só. 


Todo chulé 

Pede um pé, 

Por isso se 

Troca a meia,

Mas se a sala 

Está cheia, 

Só se sente 

O que se quer.


Sem segredo

Não creio na felicidade, mas me conformo com a realidade de uma vida que pode se extinguir sem medo, dor ou anseio, algo bem distinto da vontade, mistério que não pede segredo. Viver assim sem desejo, sem missão de ser mais feliz não seria impróprio, não fosse a ilusória pretensão de ser imprescindível para quem ficará além de mim. Vem-me agora as palavras de meu agonizante pai. Revela ele não a dor da própria morte, mas a que deixaria e deixou entre nós. 

Era o que era.

O amor 
Quando foi feito
Não tinha tamanho ,
Nenhum defeito.
Bicho solto 
Era o que era,
Largado de qualquer jeito,
Coisa mera e vadia,
Era o que era 
E dizia 
O amor quando
Foi feito. 

quinta-feira, 9 de junho de 2022

Sonho ( Texto publicado na Antologia Sobrames 2022)

Um sonho nasceu
Meio sem jeito, 
Tal um desejo
Sem pretensão
De eternidade. 

Lampejo de luz, 
Réstia de carinho
Que se insinua 
Entre o real e a
Mais duvidosa
Verdade. 

Fugir ao destino
É se fingir de morto,
Cochilar do que se quer
Com quase nenhuma 
Tola vontade. 

Naquele instante
Onde o tempo
Se mistura com o
Infinito e o que há de feio 
Se mistura com o bonito. 

Tempo sem hora 
Nem instante.
Sou tão seu, 
Quanto você é tão 
Somente eu. 

Espaço que não 
se pertence, 
Motivo que a ninguém 
Convence. 

Cantiga de amor
Que consola a gente, 
Mas que deixa marcas 
Que não se consegue 
Esquecer. 

Manias de querer , 
Manias de sentir,
Manchas de sonhos
Máculas sem dor
Do que custou ser. 




domingo, 5 de junho de 2022

Humberto

Me escondo.
Não consigo chorar
Em público 
Por quem teve a vida
Como única, definitiva
E divertida oportunidade
De se expressar contra 
Um mundo que se quer
Desumano.

Se eu pudesse falar
Com ele era só para 
Agradecer por todos
Os deslumbramentos, 
Cada instante em que se dar
Era tão o mesmo que receber. 
Que calar era tão precioso
Quanto ouvir.

Entre uma lágrima e outra
Busco a força na saudade,
De quem sonhou com a vontade
De viver num mundo feliz. 





sábado, 4 de junho de 2022

Cuecas ( texto publicado Antologia Sobrames 2022)

Meteu duas cuecas num saco azul de mercantil e se diluiu na independência. Certezas quase nenhuma, só a arrogância de assumir do que era acusado: egoísta. Qualquer acordo é melhor que uma grande causa. Mais digno aceitar o texto acusatório que tentar se defender com argumentos que ninguém quer ouvir. Deixou o cartão de crédito sobre a mesa da sala. Tinha a convicção de que nada no futuro lhe pertencia ou esperava. Talvez com um pouco de sorte, a noite parasse de chover e um prato de sopa fria espantasse o buraco da fome que sentiria na madrugada. Seguiu com um sorriso ensimesmado nos lábios, reflexo da dor de não se sentir compreendido, mas também com a sincera dúvida se tinha ou não razão. Mas pensando bem, quem escapava incólume da loucura? Quem podia se declarar perfeitamente são e certo? Caiu sem querer num buraco na calçada e ficou indolente à espera da ambulância do SAMU. Talvez encontrasse compaixão em quem era pago para tê-la. Mas já era tarde demais e a ferida não era tão grande assim. Voltou sem desejo ou culpa ao ponto de partida e se calou para o que sobrou de sua ilusão. 

Vela de Aniversário

Não tenho medo nem vontade de morrer, mas também  nenhum amor singular pela vida. Será que posso parar de respirar sem dor? Não trago dúvidas quanto ao próximo passo. Sei que ele será dado, numa direção qualquer, sem sentido definido. Certo é que não será em falso, apenas um pé na frente do outro. Simples como um sopro na vela do próximo aniversário.

sexta-feira, 3 de junho de 2022

Ninho

Sentar no 
Lugar de sempre.

Desconhecer 
A possibilidade
Da escolha.

Saber que há 
Canto e lugar
Para a paz 
E existência. 

Tatear a escuridão 
Do mundo iluminado
De olhos fechados,
Com domínio inconsciente
Do seu espaço. 

Confundir 
O lá com o acolá,
Ambos sinônimos 
Na mesma verdade 

Colher o fruto 
Que plantei outrora
Com o gosto doce
Que nunca vai embora.