Gabriela nasceu fruto do amor indevido, sem planejamento nem
vínculo, de um mercador encantado e uma quase menina cheia de sonhos e fácil de
enganar. Quando a bolsa rompeu o pai há muito não andava por aquelas bandas do
sertão. Cresceu prometendo formosura. Suas pernas roliças, tonificadas pelo caminhar
sem fim das lonjuras pra tudo onde se tinha de ir, e sua cintura tortuosa, tal
o caminho incerto que a água deixa na terra em forma de rio em tempos de chuva,
que o vestido curto e colado que seu corpo de moça vestia deixava mostrar,
enfeitiçava quem lhe botava os olhos. Graças aos conselhos da avó e o
conhecimento do triste fim da mãe, vítima da insanidade de uma sífilis mal
curada, pegada na tarefa de puta do lugar, se manteve Virgenzinha da Silva até
que lhe aparecesse o homem que lhe quisesse de verdade. E ele chegou. Chegou
num Land Rover preto banhado de pó. Não prometeu mundos nem fundos, mas a visão
de sua boca foi o suficiente para Gabriela entender que ali estava o dono de
seus beijos tão cuidadosamente guardados. Fugiram depois do descabaçamento. Num
levou nem uma muda de roupa para lembrar seu passado infeliz. Viveram dois
felizes anos entre uma cidade e outra, percorrendo toda estrada de terra que se
pudesse desbravar. Entre um Rally e outro os dois passavam uns dias se amando
em algum quarto de hotel. Não tinham casa para criar os filhos que nunca vieram. Aprendeu com ele a arte da
navegação e obtiveram sucesso em várias provas. Mas uma curva mal feita pôs fim
ao conto de fadas e Gabriela se viu novamente, depois de dois meses internada,
sozinha. Não podia voltar para a sua terra. A avó havia sido enterrada ano
passado sem sua presença no funeral. Saiu do hospital sem atinar em nada, com
uma muda de roupa e cem Reais doados pelas enfermeiras e médicos. Quando a fome
apertou comeu um sanduiche de atum com um suco de manga. Dormiu num motel
barato da periferia. Na saída o dono do estabelecimento ofereceu-lhe um emprego
fácil, que não exigia experiência alguma, e um sorriso maroto. Gabriela abriu a
bolsa, pagou o que devia, deixando bem a mostra o pouco que lhe restara. Depois
de agradecer o oferecimento seguiu seu rumo incerto. Assim nascera e assim crescera.
Seria sempre assim, até encontrar um novo amor.
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