sexta-feira, 16 de outubro de 2020

Eminente Marcador


A noite estava agradável. Uma carinhosa e mansa brisa abrandava o calor do verão. O céu de interior, abarrotado de estrelas, convidava à preguiçosa reflexão: o que somos nesta imensidão que é o universo? Esquecido, o livro deixou-se cair no chão sem barulho. Um leve impulso com o dedão balançou a rede e uma tonteira me desligou por microquânticos segundos do jugo tirano da matéria. Tateei o chão até fisgar o livro. Admirei sua capa, senti seu peso, sua textura, seu cheiro e sua força até sentir a ausência do marcador, que devia ter se perdido na queda. Folhei todas as páginas, sem descobrir por onde recomeçar. As palavras se embaralharam no meu já pouco juízo. Não consegui entendê-las; seriam alienígenas? Senti-me só, incomunicável e euforicamente perdido. Uma oportuna ocasião de escapar para outra irrealidade. Foi quando uma estrela cadente riscou o céu, me presenteando com a possibilidade do infinito desejo.  Quando o mundo parou de girar, abri o livro na página indicada pelo eminente marcador e retomei minha viagem.       

 

 

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