terça-feira, 15 de dezembro de 2020

Casa Caverna

 A casa é o máximo refúgio onde se é tudo e ao mesmo tempo ninguém. É no espaço privado que revelamos o nosso melhor e autêntico eu, não temos que negar ou doar, mas somente ser o que queremos ou pensamos que devemos ser. A casa é a prisão voluntária - trazemos sua chave no bolso – e também o castelo onde reinamos esquecidos e ausentes de um mundo supostamente real. Durante esse ano nunca foi tão comum encontramo-nos em casa. Fechar a porta na sexta a tarde e só abri-la na segunda pela manhã. Ligar para o amigo dos bares de outrora e descobri-lo sereno e sozinho com seu copo de cerveja na mão, ouvindo sua música preferida e esperando ansioso pela nossa ligação. As vezes dá uma agonia, e ansiamos por respirar o ar impuro da rua, ouvir vozes ruidosas de outras gentes, olhar para o lixo que se acumula nas esquinas que viraram entulho do que ninguém mais quer. A casa virou nosso cinema da quarta a noite, nosso happy hour de toda sexta, nosso futebol do Sábado a tarde e o restaurante do Domingo em família. Pode até parecer estranho, mas o fato é que finalmente voltamos a nossa caverna, onde nos protegemos das intempéries do tempo e dos bichos papões que sempre alimentaram nossos medos e aterrorizaram nossos sonhos. O inusitado do nosso momento é o tamanho do nosso inimigo de hoje, infinitamente minúsculo e paradoxalmente tão temível. Ficar em casa e longe da invisível e mortal partícula viral virou uma missão nada impossível, para quem consegue conviver consigo mesmo e entende que não estamos sozinhos no mundo. 

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